Por vezes a perseverança nos toma de assalto quando menos esperamos, e por conta de cada sombra que cruza nas esquinas, o que mais necessitamos, é um alento de alguém que nos ama, ou talvez muita garra em nossas mãos, como alguns fortes apaziguam em seus próprios ouvidos.
Quem tem medo do enfrentamento fica à deriva, à frente dessa fila, dura e pedregosa, estão os altivos e preparados pelo tempo, por seus antepassados, mas também por suas escolhas a qualquer tom, escrevendo em suas mentes, batidas dores acumuladas, que se desmancham no empurrão diário.
Os filósofos dizem que para conhecer um ser humano é preciso conhecer sua physis, reconhecer que elementos nele estão misturados, levando em conta as estações do ano, os ventos, onde vive e o que come.
No Japão, diariamente por trás da paciência resignada nos vagões lotados no metrô, há um conceito que move há décadas a sociedade japonesa, que o define como um povo diferenciado. Todo esforço daquela gente pra manter a ordem externa tem nome: “Gaman”.
Resumidamente é a ideia em que os indivíduos devem exercitar a paciência e a perseverança, ao enfrentarem situações inesperadas ou difíceis, pelo bem do outro.
Quantas vezes você se deparou com as dores do coletivo, e mudou de rumo pra carregar em seus ombros um peso que amassa o corpo alheio?
David Slater, professor de antropologia e diretor do Instituto de Cultura Comparada da Universidade Sophia de Tóquio, descreve “Gaman” como a forma como os indivíduos desenvolvem, dentro de si, a capacidade de perseverar e tolerar coisas inesperadas ou ruins, difíceis de superar.
É um gesto de transvaloração dos valores superiores da cultura, que depende, em boa medida, da capacidade do tratamento e do alcance civilizatório de uma terapia dos afetos.
O treinamento começa cedo, as crianças aprendem pelo exemplo dos pais, e desde o ensino fundamental, também têm contato com os conceitos de paciência e resiliência, que fazem parte do currículo escolar.
O “Gaman” tem origem nos ensinamentos budistas sobre perseverança. Foi aprimorado durante o boom econômico do pós-guerra no Japão, quando o trabalho passou a ser visto como elemento de construção da nação, significando sacrificar o tempo com a família por longas horas no escritório.
Esse hábito, workaholic, nada saudável para uma existência com qualidade, quase desfaz a boa ideia de focar a vida na construção da família a partir do esforço e dedicação no convívio com os seus.
O cerne dessa conduta está na fixação de quanto você vai contribuir e dedicar sua bela rotina tranquila, e seu tempo caro, em prol dos outros que te permeiam.
Todo ritual inclui uma representação dos acontecimentos, bem como do processo a ser influenciado por essa magia, e a lei do retorno, está inclusa nesse processo, lá na frente você colherá o fruto da semente plantada e regada bem antes, quando ainda é possível respirar e caminhar sozinho.